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Da fazenda catarinense ao time titular do Atlético-MG: os capítulos iniciais da história de Cleiton


Assim, meio acanhado, Cleiton respondeu sobre como se sente dando entrevistas. Foi o primeiro questionamento de um papo legal entre o goleiro - atual titular do Atlético-MG - e a reportagem do GloboEsporte.com, na Cidade do Galo. A ideia da conversa era conhecer um pouco mais daquele que, aos 21 anos, assumiu com absoluta tranquilidade a posição. E tem dado ao torcedor toda a segurança na ausência de Victor, o titular da meta alvinegra desde 2012.

 

- Sensação boa. O torcedor, independentemente de quem esteja no gol, vai estar tranquilo. Dá uma tranquilidade também pra comissão, que sabe que tem goleiros competentes. O importante é ajudar a equipe, que é o objetivo. Consequentemente se destaca o individual, e isso é natural.

A trajetória de Cleiton, de 1,90m, começou no interior de Santa Catarina. Natural de Descanso, foi criado na cidade de Belmonte, onde a família tem uma fazenda de vaca de leite e plantação de fumo. Foram lá os primeiros passos. E o início do sonho de ser jogador de futebol.

- A gente tem a fazenda lá, a roça, meu pai precisava de ajuda. Eu, moleque, já falava que queria jogar bola. "Poxa, o que você acha de ajudar o pai em casa?". "Sim, pai, mas deixa para outro dia, amanhã".

O começo no esporte foi na escola. Se destacava entre os garotos e chamou atenção de um empresário. Ali foi um passo decisivo para a continuidade.

- Treinava, eles precisavam de mim. Me destaquei também, fui campeão. Tive oportunidades de sair, mas não deu certo. Depois fiz um teste no Marcílio Dias. Não joguei nenhum jogo, só treinei. Estava meio largado, um empresário me viu treinando e ficou interessado. Apareceram oportunidades. O André Figueiredo (então diretor da base do Atlético) ficou interessado. Eu vim. Considero como meu primeiro clube.

O futsal, mencionado por Cleiton, também fez grande diferença. Na quadra, além de atuar no gol, ele também se arriscava na linha. Isso fez com que tivesse maior facilidade para jogar com os pés. Hoje, a saída de bola (com os pés e com as mãos) é uma das suas principais características. Gratidão ao futsal?

- Temos que desfrutar. Jogava (futsal) na escola, lá para os 11 anos, 12 anos. Jogava até na linha, por isso consigo ter uma qualidade maior com os pés. Fui me adaptando.

Relação com Victor

Ainda na infância, no interior catarinense, Cleiton já tinha Victor como referência. Na região de Belmonte, as maiores torcidas são para Grêmio e Internacional. Quando Victor chegou ao tricolor gaúcho, em 2008, Cleiton tinha 11 anos. Naquele momento, nem imaginava que seria, anos depois, companheiro de time e amigo do atual camisa 1 do Galo.

- Lá na região a maioria é torcedor do Grêmio e do Inter. Só tem fanático. Na época o Victor era o goleiro do Grêmio. Quando eu cheguei aqui, nem acreditava. Poxa, o Victor era do Grêmio, agora está no Atlético. A grandeza que ele tem. No início o pessoal falava comigo, pedia para mandar abraço para ele.

- No começo eu fiquei mais acanhado, recuado. O Victor chega, fala pra ficar à vontade, conversa com a gente. Ele que acolheu, não esperava isso.

A relação, antes distante e de admiração, agora é próxima e de parceria. Victor, se recuperando de uma tendinite no joelho esquerdo, tem apoiado e ajudado o atual titular. Cleiton conta um episódio do último clássico contra o Cruzeiro, no último domingo, quando o Atlético venceu por 2 a 0.

- Chegou em um momento do segundo tempo, lá para os 35, eu peguei a bola e saí (jogando) rápido. Ele falou (de fora): "Dá uma segurada". Pra tentar segurar mais o jogo, ficar com a bola, esperar o time recompor. Ele é experiente, sabe que isso é importante. No momento, no calor do jogo, nem pensei nisso. Minha vontade era ir pra cima do Cruzeiro, fazer outro. Mas acho que é natural, com o tempo vou aprendendo.

 

Jogos no "quintal de casa"

 

Histórias de desencontros e reencontros não faltam no futebol, e Cleiton também tem uma dessas para contar. Uma das maiores cidades próximas a Belmonte é Chapecó. São 130 km de distância. E foi justamente lá a estreia como titular do Atlético, no Brasileirão de 2017. Foi uma estreia inesperada.

- Foi tudo em cima da hora. Fui pro jogo e nem acreditei. Avisei (pra família): "Vai todo mundo lá, estou indo pro jogo". Estava feliz no aquecimento, tranquilo, o Giovanni (que seria o titular) sentiu uma dor nas costas, o médico falou que era eu (quem jogaria). Aquele jogo foi emocionante. Primeiro jogo como profissional, totalmente diferente do sub-20.

O Galo venceu a Chapecoense por 1 a 0 naquela ocasião, e os familiares que foram ao jogo de última hora voltaram felizes para casa. Dois anos depois, tiveram outra oportunidade. Essa com mais calma para planejar a ida à Arena Condá. No Brasileirão deste ano, Cleiton foi novamente titular em Chapecó. E o Atlético venceu de novo, dessa vez por 1 a 0.

- Acho que tinha mais de 40 pessoas (risos). Foi uma ex-professora minha, um colega meu, o colega queria levar parente, amigo, primo. Chamei todo mundo, foi muita gente. Da minha família eram sete, oito pessoas. E muita gente não foi porque choveu antes. Senão ia até faltar ingresso (risos).

 

Futuro

 

Cleiton fará 22 anos daqui a alguns dias (19 de agosto). Está há quatro jogos sem sofrer nenhum gol, tem ótima média (18 jogos e 11 gols sofridos), passagens por seleções de base e olhares atentos do Brasil e do mundo. Rui Costa, diretor de futebol do Atlético, já avisou que clubes europeus consultaram a situação do goleiro. Com a tranquilidade herdada da família fazendeira, ele espera. E confia que o melhor está por vir. Primeiro no Galo. Depois, quem sabe, ainda mais longe de casa.

- Oportunidade tem, muita gente fala bem de mim. Mesmo sem jogar, às vezes aparece uma oportunidade pra jogar em outro clube. A sequência também ajuda bastante, mas eu sempre sou o último a saber das coisas (risos). Se isso acontecer é fruto do meu trabalho. O que é pra ser, vai ser. Se for pra ficar, vou ficar. Se for pra ir embora, vou embora. Mas a minha intenção é ficar aqui. Conheço todo mundo, dos funcionários aos atletas. Quero construir minha história, quero deixar meu legado aqui. Consequentemente, no futuro, ter uma oportunidade de jogar na Europa, que é o sonho de todo mundo. Mas quero fazer minha parte aqui ainda.